Abobrinha de Ouro 2014: o prêmio concedido a executivos que escorregam na linguagem
Uma pessoa de notável perspicácia, que escreve com muita inteligência e até com tremendo bom humor é a articulista do famoso jornal britânico Financial Times, Lucy Kellaway, cuja coluna é publicada, para a nossa felicidade, em português com periodicidade no jornal Valor Econômico.
Se, ao ler, o intuito de alguém é assimilar algo novo, estar a par de algum procedimento cotidiano excêntrico nesse mundo de expansiva comunicação que foge do trivial, a sugestão é uma só: não se pode deixar de acompanhar o que escreve Lucy Kellaway.
No final de cada ano, ela escolhe algumas personalidades que fizeram pronunciamentos desconcertantes ou sem nexo e lhes atribui prêmios que denominou como Abobrinha de Ouro.
Entre os agraciados por ela em 2014 está, por exemplo, o CEO (chief executive officer, ou seja, o executivo principal) da AT&T, Randall Stephenson, que disse: “Nós realmente achamos que o setor está em um ponto em que se pode realmente ver uma linha de vista para a equação do subsídio apenas mudando fundamentalmente em um período de tempo muito curto.”
Deu para entender alguma coisa?
Mas foi para Tim Cook (CEO da Apple), escolhido pelo Financial Times como a personalidade do ano, que Lucy Kellaway atribuiu o seu maior prêmio, ou seja, Executivo Campeão do Obscurecimento, isto é, ECO 2014! Na opinião dela, a Apple, até então um exemplo único no mundo de empresa bem-sucedida a usar as palavras de forma elegante, sucumbiu ao besteirol. Na cidade de Cupertino (EUA), Tim Cook, numa apresentação pública, subiu ao palco para declarar: “No fim do dia… este é um dia muito fundamental para a Apple”.
“Pois é, ele conseguiu combinar duas frases vazias e conflitantes. Mais desconcertante foi o que ele disse quando vazaram todas aquelas fotos de celebridades nuas por sua iCloud: ‘Quando vejo este cenário terrível com mais distanciamento […] penso sobre a questão da conscientização. Acho que temos a responsabilidade de ampliá-la. Isso não é realmente algo de engenharia.’ Talvez até não seja, mas ele levou o ECO2014 com todos os méritos.” – Comentou Lucy Kellaway.
Uma das piores coisas para se comunicar são as mensagens de demissões e, em 2014, o prêmio vai para o CEO da Microsoft, Stephen Elop, pelo início menos apropriado de e-mails, nos quais ele mandou uma mensagem de 1.200 palavras em que cortou milhares de empregos, iniciando-os com um “Olá”!
Por fim, salientou Lucy Kellaway:
“Ao escolher minha frase Abobrinha de Ouro do ano, levei em conta a demencial: ‘Isso ressoa no seu radar?’, mas vi que era peixe pequeno comparada à terrível nova construção verbal ‘Agindo em frente’, que ouvi um executivo geralmente sensato balbuciar. ‘Agindo em frente’, com sua deslumbrante combinação de dois jargões irritantes, ressoou em meu radar de forma tão gritante que temo tê-lo quebrado!!!”
Fantástica essa Lucy Kellaway, não é?
Se puder, não deixe de ler seus artigos no jornal Valor Econômico, viu?!
Engenheiro, mestre em estatística, professor, autor de dezenas de livros, gestor educacional, palestrante e consultor. Editor chefe da Revista Criática.