também tem uma visão mais ampla de suas
nuances ao dizer: “A desigualdade é uma
coisa muito complicada, podendo ser tanto
boa como muito ruim...
Em excesso, pode produzir vários efeitos
colaterais negativos que vão do fracasso
dos serviços públicos à corrosão da demo-
cracia. Mas, ao mesmo tempo, desigual-
dade pode ser uma rota para o sucesso,
quando, por exemplo, ela resulta do em-
preendedorismo bem-sucedido. O sucesso
gera desigualdade e não se deve querer de-
sencorajar o sucesso.”
No tocante a
ajuda externa
, há quem
diga que ela pode fazer mais mal do que
bem para o desenvolvimento de uma eco-
nomia. Angus Deaton salienta: “A ajuda
externa pode ser extremamente útil, por
exemplo, quando auxilia a manter hospitais
e curar crianças que de outra forma mor-
reriam. Isso só pode ser bom. Entretanto,
ajuda externa excessiva pode ter conse-
quências não intencionais, visto que pode
conduzir à corrupção e criar tensão social
entre as elites dominantes da população.”
Finalmente, no caso da
determinação
da pobreza
, Deaton enfatiza: “Concentrar-
-se no número de pessoas que está abaixo
dessa linha é como tentar achar um unicór-
nio na floresta. Por isso, não sei se é sensa-
to o Banco Mundial se comprometer tanto
com esse projeto. Existe muito mais coisas
envolvidas na pobreza do que apenas a falta
de dinheiro, como se pode constatar diga-
mos na Índia, um país que cresceu substan-
cialmente em termos de renda
per capita
,
mas no qual a educação e a saúde são ofe-
recidos com frequência de forma deplorável
para a população. É preciso ir além do di-
nheiro para entender bem as mudanças na
prosperidade.”
↘
Literatura
– A ganhadora nessa cate-
goria foi a jornalist
a bielorrussa Sve-
tlana Alexievich, que escreveu livros que
“escavam” as ruínas do passado soviéti-
co e expõem os efeitos colaterais da falên-
cia do socialismo real, ou seja, suas obras
são de
não ficção
!!!
Na realidade, ela nasceu na Ucrânia e
se mudou para a Bielorrússia com a família
depois que o pai deixou o serviço militar. No
vilarejo onde cresceu, ouvia histórias que
as mulheres mais velhas contavam sobre
a guerra. Não encontrando histórias como
aquelas nos livros, assim, chegou à conclu-
são de que seria uma boa
ideia escrevê-las. Ao longo
de mais de quatro décadas,
escreveu poemas, ensaios,
peças teatrais e roteiros para
cinema. Mas seus livros mais
notáveis resultam de um tra-
balho quase arqueológico.
Esse
registro do cotidiano e
das memórias de seu povo
conquistou os votos da Aca-
demia Sueca, acostuma-
da mais a privilegiar aqueles
que compõem obras de fic-
ção.
O Nobel de Literatura não
era concedido a um escritor de não ficção desde 1953
,
quando
o ex-primeiro-ministro Winston Churchill foi homenageado por sua
“brilhante oratória em defesa dos valores humanos”.
Svetlana Alexievich estava passando roupa em sua casa, em
Minsk, capital da Bielorússia, quando atendeu o telefone e desco-
briu que ganhara o Nobel. “Fantástico!”, ela exclamou. A Academia
Sueca justificou: “Os livros dessa jornalista são um monumento
ao sofrimento e à coragem e ressaltou o caráter polifônico de sua
obra.”
O mesmo adjetivo já foi associado aos volumosos romances
do escritor russo Fiódor Dostoiévski (1821-1881), nos quais o
discurso do narrador não se sobrepõe às vozes dos inúmeros
personagens que desfilam ao longo da narrativa. Svetlana Alexie-
vich recupera essa tradição ao dar voz aos personagens reais que
povoam seus livros.
A Guerra Não Tem Rosto de Mulher,
foi o seu
primeiro livro, no qual reuniu as memórias de mulheres durante a
guerra e que não foi bem recebido pelas autoridades, que impedi-
ram a publicação...
No livro
As Crianças de Zinco
, publicado em 1989, ela apresen-
ta a trágica invasão do Afeganistão pelos soviéticos do ponto de
vista das mães dos soldados mortos. Em 1997, publicou seu livro
mais célebre,
Oração de Chernobil.
Durante três anos, ela entre-
vistou mais de 500 sobreviventes do acidente nuclear de 1986 e
transformou em literatura as histórias que ouviu.
O único livro de Svetlana Alexievich disponível em português é
O
Fim do Homem Soviético,
editado em Portugal. Nele, ela narra a de-
sintegração do
Homo sovieticus
, a identidade formada por décadas
de autoritarismo.
Aliás, em 2013, ao receber o prêmio da Paz dos Livreiros Ale-
mães, a escritora afirmou: “O homem soviético não desapareceu.
Para essa classe de homem, a liberdade demasiada é ter 20 tipos
de salsicha para escolher.”
Svetlana Alexievich foi perseguida por Aleksandr Lukashenko,
presidente bielorrusso que se mantém no poder desde 1994 (foi
reeleito em 2015...), segundo muitos entendidos, graças a eleições
fraudulentas.
Pois é, o mesmo mérito que agradou à Academia Sueca tem
incomodado muito o governo da Bielorrússia. Svetlana Alexievich
até tem flertado com a literatura de ficção, porém o seu maior com-
promisso é com a
verdade
!!!
A ganhadora do Nobel de Literatura,
Svetlana Alexievich.
NOBEL
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C R I ÁT I C A
T U D O S O B R E E C O N O M I A C R I A T I V A