Table of Contents Table of Contents
Previous Page  30 / 52 Next Page
Information
Show Menu
Previous Page 30 / 52 Next Page
Page Background

também tem uma visão mais ampla de suas

nuances ao dizer: “A desigualdade é uma

coisa muito complicada, podendo ser tanto

boa como muito ruim...

Em excesso, pode produzir vários efeitos

colaterais negativos que vão do fracasso

dos serviços públicos à corrosão da demo-

cracia. Mas, ao mesmo tempo, desigual-

dade pode ser uma rota para o sucesso,

quando, por exemplo, ela resulta do em-

preendedorismo bem-sucedido. O sucesso

gera desigualdade e não se deve querer de-

sencorajar o sucesso.”

No tocante a

ajuda externa

, há quem

diga que ela pode fazer mais mal do que

bem para o desenvolvimento de uma eco-

nomia. Angus Deaton salienta: “A ajuda

externa pode ser extremamente útil, por

exemplo, quando auxilia a manter hospitais

e curar crianças que de outra forma mor-

reriam. Isso só pode ser bom. Entretanto,

ajuda externa excessiva pode ter conse-

quências não intencionais, visto que pode

conduzir à corrupção e criar tensão social

entre as elites dominantes da população.”

Finalmente, no caso da

determinação

da pobreza

, Deaton enfatiza: “Concentrar-

-se no número de pessoas que está abaixo

dessa linha é como tentar achar um unicór-

nio na floresta. Por isso, não sei se é sensa-

to o Banco Mundial se comprometer tanto

com esse projeto. Existe muito mais coisas

envolvidas na pobreza do que apenas a falta

de dinheiro, como se pode constatar diga-

mos na Índia, um país que cresceu substan-

cialmente em termos de renda

per capita

,

mas no qual a educação e a saúde são ofe-

recidos com frequência de forma deplorável

para a população. É preciso ir além do di-

nheiro para entender bem as mudanças na

prosperidade.”

Literatura

– A ganhadora nessa cate-

goria foi a jornalist

a bielorrussa Sve-

tlana Alexievich, que escreveu livros que

“escavam” as ruínas do passado soviéti-

co e expõem os efeitos colaterais da falên-

cia do socialismo real, ou seja, suas obras

são de

não ficção

!!!

Na realidade, ela nasceu na Ucrânia e

se mudou para a Bielorrússia com a família

depois que o pai deixou o serviço militar. No

vilarejo onde cresceu, ouvia histórias que

as mulheres mais velhas contavam sobre

a guerra. Não encontrando histórias como

aquelas nos livros, assim, chegou à conclu-

são de que seria uma boa

ideia escrevê-las. Ao longo

de mais de quatro décadas,

escreveu poemas, ensaios,

peças teatrais e roteiros para

cinema. Mas seus livros mais

notáveis resultam de um tra-

balho quase arqueológico.

Esse

registro do cotidiano e

das memórias de seu povo

conquistou os votos da Aca-

demia Sueca, acostuma-

da mais a privilegiar aqueles

que compõem obras de fic-

ção.

O Nobel de Literatura não

era concedido a um escritor de não ficção desde 1953

,

quando

o ex-primeiro-ministro Winston Churchill foi homenageado por sua

“brilhante oratória em defesa dos valores humanos”.

Svetlana Alexievich estava passando roupa em sua casa, em

Minsk, capital da Bielorússia, quando atendeu o telefone e desco-

briu que ganhara o Nobel. “Fantástico!”, ela exclamou. A Academia

Sueca justificou: “Os livros dessa jornalista são um monumento

ao sofrimento e à coragem e ressaltou o caráter polifônico de sua

obra.”

O mesmo adjetivo já foi associado aos volumosos romances

do escritor russo Fiódor Dostoiévski (1821-1881), nos quais o

discurso do narrador não se sobrepõe às vozes dos inúmeros

personagens que desfilam ao longo da narrativa. Svetlana Alexie-

vich recupera essa tradição ao dar voz aos personagens reais que

povoam seus livros.

A Guerra Não Tem Rosto de Mulher,

foi o seu

primeiro livro, no qual reuniu as memórias de mulheres durante a

guerra e que não foi bem recebido pelas autoridades, que impedi-

ram a publicação...

No livro

As Crianças de Zinco

, publicado em 1989, ela apresen-

ta a trágica invasão do Afeganistão pelos soviéticos do ponto de

vista das mães dos soldados mortos. Em 1997, publicou seu livro

mais célebre,

Oração de Chernobil.

Durante três anos, ela entre-

vistou mais de 500 sobreviventes do acidente nuclear de 1986 e

transformou em literatura as histórias que ouviu.

O único livro de Svetlana Alexievich disponível em português é

O

Fim do Homem Soviético,

editado em Portugal. Nele, ela narra a de-

sintegração do

Homo sovieticus

, a identidade formada por décadas

de autoritarismo.

Aliás, em 2013, ao receber o prêmio da Paz dos Livreiros Ale-

mães, a escritora afirmou: “O homem soviético não desapareceu.

Para essa classe de homem, a liberdade demasiada é ter 20 tipos

de salsicha para escolher.”

Svetlana Alexievich foi perseguida por Aleksandr Lukashenko,

presidente bielorrusso que se mantém no poder desde 1994 (foi

reeleito em 2015...), segundo muitos entendidos, graças a eleições

fraudulentas.

Pois é, o mesmo mérito que agradou à Academia Sueca tem

incomodado muito o governo da Bielorrússia. Svetlana Alexievich

até tem flertado com a literatura de ficção, porém o seu maior com-

promisso é com a

verdade

!!!

A ganhadora do Nobel de Literatura,

Svetlana Alexievich.

NOBEL

30

C R I ÁT I C A

T U D O S O B R E E C O N O M I A C R I A T I V A